À Hélène Kiener (Estrasburgo/França),
13 de agosto de 1949.
Prezada senhorita Kiener,
No meu ensaio “O espírito da psicologia” (Eranos-Jahrbuch 1946) (1) demonstrei, com auxílio de material histórico, que o inconsciente coletivo foi comparado simbolicamente ao céu estrelado – especialmente por Paracelso. Neste ensaio dediquei um capítulo inteiro ao inconsciente como “consciência múltipla”. É impossível repetir-lhe este capítulo inteiro. Sugiro que mande vir, por intermédio da biblioteca da Universidade de Estrasburgo, este ensaio que está na biblioteca de Basileia. Eu, infelizmente, não possuo nenhum exemplar dele.
A fundamentação de uma analogia efetiva entre inconsciente e cosmos é uma tarefa praticamente impossível. Também não se pode afirmar a suposta organização planetária em torno do núcleo do átomo, pois é apenas uma imagem contestável pela qual certos físicos ilustraram a relação matemática entre os elétrons e o núcleo do átomo. Uso a mesma imagem para explicar a relação dos arquétipos com o arquétipo central do si-mesmo. Isto não prova nenhuma identidade ou semelhança efetivas, mas baseia-se no fato de que a explicação emprega a mesma imagem para tornar de alguma forma concebíveis certas relações irrepresentáveis. Isto vale também para os símbolos históricos da constituição do inconsciente dos quais tratei no ensaio acima mencionado. Não é apenas possível mas, por certas razoes, também provável que a constituição do inconsciente coletiva coincida, de maneira peculiar e totalmente inconcebível, como os acontecimentos objetivos. Tentei formular esta coincidência como sincronicidade, e estou atualmente ocupado com este trabalho. Mas não se pode dizer que a coincidência aconteça na analogia das leis do movimento dos planetas ou do céu estrelado. Como vê, trata-se aqui de um problema muito difícil no qual é melhor a senhorita não tocar. Para os seus propósitos basta o fato de que desde tempos remotos foi suposta uma analogia entre o céu de estrelas e o inconsciente, ao menos como símbolo.
Além disso, nada tenho a observar.
Saudações cordiais, C. G. Jung.
Redação revista sob o título “Considerações teóricas sobre a natureza do psíquico”, em Obras Completas: A natureza da psique, Vol. 8/2, § 343-442.
*Projeto Memória - Registro de transcrição das Cartas de Jung, tomando como referência 70 anos, como se fosse hoje. Esse projeto de pesquisa desenvolvido desde 2017, visa resgatar momentos históricos e reflexões pessoais de C. G. Jung.
13 de agosto de 1949.
Prezada senhorita Kiener,
No meu ensaio “O espírito da psicologia” (Eranos-Jahrbuch 1946) (1) demonstrei, com auxílio de material histórico, que o inconsciente coletivo foi comparado simbolicamente ao céu estrelado – especialmente por Paracelso. Neste ensaio dediquei um capítulo inteiro ao inconsciente como “consciência múltipla”. É impossível repetir-lhe este capítulo inteiro. Sugiro que mande vir, por intermédio da biblioteca da Universidade de Estrasburgo, este ensaio que está na biblioteca de Basileia. Eu, infelizmente, não possuo nenhum exemplar dele.
A fundamentação de uma analogia efetiva entre inconsciente e cosmos é uma tarefa praticamente impossível. Também não se pode afirmar a suposta organização planetária em torno do núcleo do átomo, pois é apenas uma imagem contestável pela qual certos físicos ilustraram a relação matemática entre os elétrons e o núcleo do átomo. Uso a mesma imagem para explicar a relação dos arquétipos com o arquétipo central do si-mesmo. Isto não prova nenhuma identidade ou semelhança efetivas, mas baseia-se no fato de que a explicação emprega a mesma imagem para tornar de alguma forma concebíveis certas relações irrepresentáveis. Isto vale também para os símbolos históricos da constituição do inconsciente dos quais tratei no ensaio acima mencionado. Não é apenas possível mas, por certas razoes, também provável que a constituição do inconsciente coletiva coincida, de maneira peculiar e totalmente inconcebível, como os acontecimentos objetivos. Tentei formular esta coincidência como sincronicidade, e estou atualmente ocupado com este trabalho. Mas não se pode dizer que a coincidência aconteça na analogia das leis do movimento dos planetas ou do céu estrelado. Como vê, trata-se aqui de um problema muito difícil no qual é melhor a senhorita não tocar. Para os seus propósitos basta o fato de que desde tempos remotos foi suposta uma analogia entre o céu de estrelas e o inconsciente, ao menos como símbolo.
Além disso, nada tenho a observar.
Saudações cordiais, C. G. Jung.
Redação revista sob o título “Considerações teóricas sobre a natureza do psíquico”, em Obras Completas: A natureza da psique, Vol. 8/2, § 343-442.
*Projeto Memória - Registro de transcrição das Cartas de Jung, tomando como referência 70 anos, como se fosse hoje. Esse projeto de pesquisa desenvolvido desde 2017, visa resgatar momentos históricos e reflexões pessoais de C. G. Jung.
Comentários
Enviar um comentário