Avançar para o conteúdo principal

 


Monsieur Le Docteuer Ch. Lichtenthaeler (1)

 


Leysin/Suíça


07 de novembro de 1950


Monsieur et cher Collègure,


Ainda que interesse aos psicólogos também a personalidade singular de Paracelso, a psicologia se ocupa principalmente com suas ideias. Eu mesmo escrevi um livro sobre suas ideias principais. Entre elas está a ideia da “theorica”, de especial interesse para a psicologia (2). Através da “theorica”, Paracelso transmite ao paciente uma noção de sua doença, dando-lhe assim a possibilidade de assimilá-la psiquicamente.

Além disso, é possível encontrar na doutrina esotérica de Paracelso um conhecimento exato dos processos inconscientes de doenças, bem como a compreensão de formas simbólicas que são de grande importância como expressão de conteúdos patogênicos, sobretudo para a terapia das neuroses. Paracelso desenvolveu essas ideias em sua Vita Longa. Ele transmitiu o conhecimento desses pressupostos inconscientes aos seus alunos (sobretudo o Gerardo Dorneo); com o desenvolvimento do racionalismo e do materialismo científico, essas ideias quase se perderam de novo. Somente há pouco tempo foram redescobertas as causas psíquicas inconscientes de certas doenças. Nesse contexto é de grande interesse para o psicólogo a obra de Paracelso. As ideias dele apresentam evidentemente dificuldades fora do comum, e sei que elas permanecem quase incompreensíveis para um médico que não conhece de própria experiência o papel importante do pano de fundo inconsciente nas neuroses e psicoses.

Espero que minha resposta satisfaça a sua pergunta. (3)

Je vous pire d’agréer, Monsieur et Cher Collègue, l’experession de mês sentiments distingues. C. G. Jung.

 

(1)  Charles Lichtenthaeler era colaborador do Prof. Dr. A. Rollier, fundador do sanatório universitário de Leysin. Desde 1963, professor de história da Medicina na Universidade de Hamburgo.

(2)  Paracelso, o médico. Obras Completas: Vol. XV, § 41.

(3)  Trata-se da pergunta sobre a importância de Paracelso e de sua doutrina para a psicologia.


Comentários

Mensagens populares deste blogue

Ao Dr. Hans A. Illing

Los Angeles (Calif. EUA), 26 de janeiro de 1955.   Prezado Doutor, Enquanto médico, considero a perturbação psíquica (neurose ou psicose) uma doença individual; e assim deve ser tratada a pessoa. No grupo o indivíduo só é atingido na medida em que é membro do mesmo (1). Em princípio isto é um grande alívio, pois no grupo a pessoa é preservada e está afastada de certa forma. No grupo o sentimento de segurança é maior e o sentimento de responsabilidade é menor. Certa vez entrei com uma companhia de soldados numa terrível geleira coberta de névoa espessa. A situação foi tão perigosa que todos tiveram que ficar no lugar onde estavam. Não houve pânico, mas um espírito de festa popular! Se alguém estivesse sozinho ou apenais em dois, a dificuldade da situação não teria sido levada na brincadeira. Os corajosos e experientes tiveram oportunidade de brilhar. Os medrosos puderam valer-se da intrepidez dos mais afoitos e ninguém pensou alto na possibilidade de um bivaque improvisado na ...

Aniela Jaffé (Zurique)

Carta à Aniela Jaffé (Zurique) “Bollingen,  12 de abril de 1949. Prezada Aniela, (...) Sua carta chegou num período de reflexões difíceis. Infelizmente nada lhe posso falar a respeito. Seria demais. Também eu ainda não cheguei ao final do caminho do sofrimento. Trata-se de compreensões difíceis e penosas (1). Após longo vagar no escuro, surgiram luzes mais claras, mas não sei o que significam. Seja como for, sei por que e para que preciso da solidão de Bollingen. É mais necessária do que nunca. (...)            Eu a parabenizo pela conclusão de “Séraphita” (2). Ainda que não tivesse aproveitado em nada a Balzac desviar-se do si-mesmo, gostaríamos de poder fazê-lo também. Sei que haveríamos que pagar mais caro por isso. Gostaríamos de ter um Javé Sabaoth como kurioz twn daimonwn (3). Compreendo sempre mais porque quase morri e vejo-me forçado a desejar que assim tivesse sido. O cálice é amargo. Saudações cordiai...

À Aniela Jaffé

  À Aniela Jaffé Zurique, 26 de dezembro de 1954.   Prezada Aniela, Não sei o que mais admiro, se sua paciência, seu sentido do essencial e sua força descritiva, ou a penetração admiravelmente profunda de Broch no mistério da transformação, a perseverança e coerência dele e, finalmente, a maestria linguística dele (1). Em última instância, devo alegrar-se por não ter tido esta capacidade linguística, pois se a tivesse tido nos anos 1914-1918 (2), meu desenvolvimento posterior teria tomado outro rumo, menos condizente com minha natureza. Apesar disso, Broch e eu tivemos algo em comum: esmagados pela numinosidade das coisas vistas, um envolveu sua visão num nevoeiro impenetrável (ou quase assim) de imagens, enquanto o outro a cobriu com uma montanha de experiências práticas e paralelos históricos. Ambos quiseram mostrar e revelar, mas, por excesso de motivos, ambos ocultaram novamente o inefável e assim abriram novos caminhos laterais para o erro. Aconteceu-nos o mesmo q...