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To Carol Jeffrey

Londres, 03 de julho de 1954.

 

Dear Mrs. Jeffrey,

Peço desculpas pela demora em responder. Tenho pouco tempo e às vezes minhas energias são poucas. Olhei os seus quadros com apreço e admiração. Fiquei surpreso com a sua pergunta: “Para quem pintei os quadros?” Eles são seus, e a senhora os pintou como apoio de seu próprio processo de individuação. Como o Jongleur de Notre-Dame exibiu suas obras de arte em honra da Madonna (2), assim a senhora pintou para o si-mesmo. Em reconhecimento a este fato, estou devolvendo para a senhora os quadros. Eles não devem ficar aqui, e em nenhum outro lugar a não ser com a senhora, pois eles representam a aproximação dos dois mundos, do espírito e do corpo, ou do ego e do si-mesmo. Os opostos se procuram mutuamente, de modo que o outro lado vem para cá e o aqui é engolido pelo lá. (...)

De qualquer forma, agradeço o fato de me haver mostrado os seus quadros. Acredito que vá ajudar-lhe contemplá-los pro tanto tempo quanto for necessário para compreendê-los. (...)

Espero que no mais tudo esteja em ordem com a senhora.

Yours sincerely, C. G. Jung.

 

(1)Mrs. Carol Jeffrey, psicoterapeuta na Inglaterra.

(2)”Le Jongleur de Notre-Dame” é o personagem principal de uma história francesa do século XIII: um saltimbanco já idoso entrou nem mosteiro e, como não tivesse nada para ofertar, executou suas danças e artes diante da estátua da Santíssima Virgem, e ela lhe retribuiu com um amável sorriso.

 

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