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To Prof. Calvin S. Hall

 

To Prof. Calvin S. Hall

Western Reserve University

Cleveland (Ohio) EUA, 08 de novembro de 1954.

 

Prezado professor Hall,

Muito grato por sua gentil resposta. Estou satisfeito por ter levado minha crítico com espírito esportivo (1).  A minha dificuldade está em aturar críticas desatentas e superficiais. Nenhum de meus críticos tentou alguma vez aplicar conscientemente os meus métodos. Se alguém o fizer, descobrirá fatalmente o que eu chamo de motivos arquetípicos. Eles aparecem nos sonhos, bem como na linguagem e nas obras de nossas poetas. A única questão é: são espontâneos ou devidos à tradição? Para respondê-la é preciso entrar nos detalhes, mas são precisamente os detalhes que os críticos desprezam. Durante muitos anos interpretei em torno de 2000 sonhos por ano, o que me deu certa experiência neste campo.

Como já lhe falei, tenho minhas restrições ao termo “sistema”. Se eu tivesse um sistema, teria construído certamente conceitos melhores e mais filosóficos do que aqueles que estou empregando. Veja, por exemplo, animus e anima. Nenhum filósofo sensato teria inventado tais ideias irracionais e canhestras. Quando as coisas coincidem, nem sempre se trata de um sistema filosófico; às vezes são os fatos que coincidem. Motivos mitológicos são fatos; eles nunca mudam; somente as teorias mudam. Nenhuma época poderá negar a existência de motivos mitológicos; não se trata de um obscurecimento bárbaro da mente. Contudo, a teoria sobre eles pode mudar muito a qualquer época.

Anexo envio-lhe uma lista de todos os meus escritos, de modo que poderá compará-la com sua lista de meus livros.

Peço desculpas por minha impaciência.

Yours sincerely, C. G. Jung

 

(1)Cf. carta a Hall, de 06 de outubro de 1954.

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