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Para o Prof. Chung-Yuan Chang


Creativity and Taoism: A Study of Chinese Philosophy, Art and ...
Para o Prof. Chung-Yuan Chang (1)

Nova Iorque

26 de junho de 1950.

Der Sir,
Li o seu ensaio (2) com grande interesse e posso dizer-lhe que concordo basicamente com os seus pontos de vista. Vejo o taoísmo na mesma ótica do senhor. Sou grande admirador da filosofia de Chuang-tzu. Estava exatamente imerso no estudo de seus estudos, quando chegou a sua carta.
O senhor certamente sabe que o taoísmo formula princípios psicológicos que são de natureza bem universal. Eles são de fato tão abrangentes que podem ser aplicados a toda a humanidade. Mas, por outro lado, exatamente por serem tão universais, os princípios do taoísmo precisam de uma retradução e especificação quando se trata de sua aplicação prática. Evidentemente é inegável princípios gerais são da maior importância, mas é importante também conhecer nos mínimos detalhes o caminho que leva à sua compreensão real. O perigo da mente ocidental está na simples aplicação de palavras em vez de fatos. O que a mente ocidental precisa é da experiência concreta de fatos que não podem ser substituídos por palavras. Por isso estou interessados sobretudo nos caminhos e métodos que podem conscientizar a mente ocidental dos fatos psicológicos subjacentes ao conceito do Tao, se é que este pode ser chamado de conceito. A maneira de o senhor colocar a questão corre o perigo de deixar o Tao como simples idealismo ou ideologia para a mente ocidental. Se alguém pudesse chegar à verdade aprendendo as palavras da sabedoria, então o mundo já teria sido salvo nos tempos remotos de Lao-tse. Mas, como diz muito bem Chuang-tzu, o problema está em que os velhos sábios não conseguiram iluminar o mundo, pois não havia mentes suficientes que pudessem ser iluminadas. Pouco adianta ensinar sabedoria. Em todo caso, a sabedoria não pode ser ensinada por palavras. Ela só é possível por contato pessoal e por experiência imediata.
A maior e quase insuperável dificuldade está na questão dos caminhos e dos meios de induzir as pessoas a fazerem as experiências psicológicas indispensáveis que abram os seus olhos para a verdade subjacente. A verdade é uma só e a mesma em toda parte, e devo dizer que o taoísmo é uma das formulações mais perfeitas que jamais conheci.
Sincerely yours,
C. G. Jung.

(1) Dr. Chung-Yuan Chang, professor de filosofia chinesa no Asia Institute, Nova Iorque; mais tarde professor de filosofia na Universidade de Havai. Em 1955, 1956 e 1958 falou nos encontros de Eranos.
(2) “An Interpretation of Taoism in the Light of Modern Psychology”, em forma ampliada no livro Creativity and Taoism, 1963.

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