Los Angeles (Calif.)
EUA, 26 de março de 1951.
Prezado amigo,
No final desta semana
irei a Bollingen para passar lá o mês de abril, pois tenho muito trabalho a
fazer. Esta semana estarei disponível, se quiser aparecer aqui. Agradeço muito
as duas cartas que me enviou. Há muitas questões e possíveis mal-entendidos que
só podem ser esclarecidos numa conversar pessoal. Caso contrário, deveria
escrever tratados inteiros. Quero observar apenas que não me tornei “mais
cristão”, mas que somente agora me sinto um pouco mais em condições de
contribuir com algo para a psicologia do cristianismo. Sonhos podem significar
muitas coisas, mas só temos uma premissa teórica para sua explicação. O princípio
científico “Principia explicandi non sunt multiplicanda praeter necessitatem”
(1) deve ser levado a sério. Por isso devemos ir tão longe quanto possível com
a teoria da compensação (2).
O tipo da quaternidade é um fato empírico, não uma doutrina. Como tantos outros
sistemas, o cristianismo teve até agora 4 figuras metafísicas: a Trindade + purioz qeoz ariqmu tetartoz (3). O
inconsciente se expressa de preferência em quaternidades, sem levar em
consideração a tradição cristã. A quaternidade é tanto veterotestamentária
quanto egípcia. Vishnu tem 4 rostos, etc. A theologia
naturalis (4) precisa reconhecer este fato, caso contrário não entrará em
contato com a psicologia. A quaternidade não é uma doutrina discutível, mas um
fato ao qual está sujeita também a dogmática, como acima demonstramos.
Uma vez que a “incarnatio
Dei” nada transmite de inteligível às pessoas de hoje, o sarx egeneto (5) precisa ser traduzido mais ou
menos assim: “Assumiu determinada forma empírica”. Esta fórmula lançaria a
ponte para a psicologia.
Por enquanto, saudações
cordiais de seu Carl.
(1) Cf.
Carta a Frischknecht, de 07.04. 1945, nota 2.
(2) Sendo
a psique um fenômeno energético, verificam-se continuamente autorregulações
(compensações) inconscientes, com efeito equilibrador. Conteúdos e tendências
emergentes do inconsciente compensam uma atitude unilateral da consciência através
da ênfase em atitudes opostas. Sobre a psique como sistema autorregulador, cf.
OC, Vol. VIII, § 159s.
(3) “O
Deusde fogo, o quarto na numeração”. Assim descreviam os naassenos os
demiurgos. Cf. Aion, 1951, Vol. IX/2, § 128.
(4) A
teologia natural procura Deus por meio da razão natural, através da observação
da natureza, e não na iluminação da fé.
(5) Fez-se carne.
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