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A um destinatário não identificado

Inglaterra, 01 de novembro de 1951.

 

Dear Mrs. N.

Lamento estar atrasado com minha resposta. Sua carta chegou enquanto eu estava de férias fora de casa. De qualquer forma, não poderia tê-lo recebido nessa época.

Se o senhor não tivesse tido esta recaída de tuberculose, eu o teria aconselhado a vir novamente a Zurique para conversarmos sobre as dificuldades que parecem existir entre o senhor e suas analistas. Talvez a causa esteja no fato de serem mulheres!

Enquanto está engessado, o senhor tem tempo para pensar e ler; e eu o aconselho a fazer amplo uso disso. Tente descobrir o máximo sobre o senhor mesmo com o auxílio da literatura. Isto poderá dar-lhe alguma coragem masculina, de que o senhor parece estar precisando. A longo prazo, a influência psicológica de mulheres não é necessariamente benéfica. Quanto mais desamparado o homem estiver, tanto mais é evocado o instinto materno, e não há mulher que consiga resistir a esta evocação. Mas maternalidade em excesso corrói a psicologia do homem de modo perigoso. Tudo que conseguir com esforço próprio compensa cem anos junto a uma analista.

Infelizmente não sou capaz de interpretar o seu sonho (1). Não ousaria tratar o seu material a partir de minhas intuições. Mas, como figuro em seus sonhos, preciso dizer que gosto de paredes grossas, de árvores e coisas verdes e de muitos livros. Talvez o senhor precise dessas três boas coisas, também.

Com os melhores votos,

Yours sincerely,

C. G. Jung.

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