Ao Pastor Dr. Walter
Ushadel
Hamburgo, 06 de
fevereiro de 1952.
Prezado Pastor,
É extraordinariamente
amável de sua parte querer dedicar-me o seu livro (1), e gostaria muito de
aceitar esta dedicatória se eu tivesse certeza de que no futuro o senhor não se
arrependerá por me haver dedicado o livro. Minha esposa chamou-me a atenção a
respeito, sugerindo que isso pode acontecer e eu devo dar-lhe razão. Será
publicado em breve um escrito meu bastante controverso, com o título Resposta a Jó. Infelizmente não posso
entrar em detalhes sobre o que nele escrevi, mas apenas dizer-lhe que este
escrito toma uma posição bem crítica diante do Javé veterotestamentário e
consequentemente da recepção cristã do referido conceito de Deus. Mostrei o
manuscrito a três amigos teólogos, e eles ficaram chocados. Por outro lado,
várias pessoas mais jovens tiveram impressão positiva. Mas é fácil imaginar que
meu escrito possa ter efeito devastador em meios de pensamento e sentimento
ortodoxos – sobretudo contra mim e contra todos os que comigo mantêm relações
de amizade. Não gostaria de expô-lo sem razão a este perigo. Por isso lhe peço
que considere mais uma vez o caso.
O motivo de meu escrito
é um sentimento de responsabilidade que se torna cada vez mais premente e ao
qual já não pude colocar nenhuma resistência. Também não pude, a exemplo de
Albert Schweitzer, procurar um conveniente refúgio longe da Europa e ali
começar uma práxis. Tive de conformar-me com o velho axioma “Hic Rhodus, hic
salta” e encarar de frente o problema das pessoas cristãs de hoje. Talvez fosse
melhor o senhor esperar até que o meu texto seja publicado (2).
Entrementes, receba as
saudações cordiais e os melhores agradecimentos de C. G. Jung.
(1) Walter Ushadel, Der Mensch und die Mächte
des Undbewussten. Studie zur Begegnung con Psyschotherapie und Seelsorge,
Kassel 1952. Traz impressa a dedicatósia> “Sr. Prof. Dr. med., Dr.
iur.h.c. Carl Gustav Jung, dedicado com gratidão”.
(2) Jung
enviou-lhe Resposta a Jó com a dedicatória manuscrita: “Ao Pastor W. Ushadel
com amizade e, por isso mesmo, com hesitação do autor, março de 1952”.
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