Avançar para o conteúdo principal

Ao Professor Manfred Bleuler


Zurique, 23 de março de 1955.

 

Prezado colega,

Receba meu sincero agradecimento pelo amável convite de falar sobre esquizofrenia no Congresso Internacional de Psiquiatria (1). Seria um grande prazer para mim – sem falar da grande honra – dar essa conferência. Infelizmente minha idade está avançada, e um compromisso desses se torna difícil para mim. Não suportaria mais o esforço de uma conferência e por isso devo renunciar à satisfação de seu desejo. Faço isto com o maior pesar, pois há aproximadamente 50 anos eu chamei a atenção para a psicologia dessa doença que, na época, era designada por dementia praecox (2). Às vezes pareço um anacronismo para mim mesmo.

Renovo os meus sinceros agradecimentos e permaneço com elevada consideração. C. G. Jung.

 

(1)Prof. Manfred Bleuler havia pedido a Jung dar uma conferência sobre esquizofrenia no Segundo Congresso Internacional de Psicoterapia (1-7 de setembro de 1957, em Zurique). Com a recusa de Jung, pediu-lhe numa segunda carta que elaborasse um simples texto de conferência “resumindo para este Congresso seu trabalho sobre esquizofrenia”, para poupar-lhe o esforço da conferência. Jung aceitou a sugestão. Sua conferência “A esquizofrenia” foi lido por seu neto, o psiquiatra Dr. Dieter Baumann. Foi publicada em Schweizer Archiv für Neurologie und Psychiatrie, Vol. 81, caderno 1-2, Zurique 1958, bem como no volume III das Obras Completas.

(2)Em seu livro A psicologia da dementia praecox, 1907 (Vol. III), Jung trata pela primeira vez do aspecto psicológico da esquizofrenia.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Aniela Jaffé (Zurique)

Carta à Aniela Jaffé (Zurique) “Bollingen,  12 de abril de 1949. Prezada Aniela, (...) Sua carta chegou num período de reflexões difíceis. Infelizmente nada lhe posso falar a respeito. Seria demais. Também eu ainda não cheguei ao final do caminho do sofrimento. Trata-se de compreensões difíceis e penosas (1). Após longo vagar no escuro, surgiram luzes mais claras, mas não sei o que significam. Seja como for, sei por que e para que preciso da solidão de Bollingen. É mais necessária do que nunca. (...)            Eu a parabenizo pela conclusão de “Séraphita” (2). Ainda que não tivesse aproveitado em nada a Balzac desviar-se do si-mesmo, gostaríamos de poder fazê-lo também. Sei que haveríamos que pagar mais caro por isso. Gostaríamos de ter um Javé Sabaoth como kurioz twn daimonwn (3). Compreendo sempre mais porque quase morri e vejo-me forçado a desejar que assim tivesse sido. O cálice é amargo. Saudações cordiai...

Ao Dr. Hans A. Illing

Los Angeles (Calif. EUA), 26 de janeiro de 1955.   Prezado Doutor, Enquanto médico, considero a perturbação psíquica (neurose ou psicose) uma doença individual; e assim deve ser tratada a pessoa. No grupo o indivíduo só é atingido na medida em que é membro do mesmo (1). Em princípio isto é um grande alívio, pois no grupo a pessoa é preservada e está afastada de certa forma. No grupo o sentimento de segurança é maior e o sentimento de responsabilidade é menor. Certa vez entrei com uma companhia de soldados numa terrível geleira coberta de névoa espessa. A situação foi tão perigosa que todos tiveram que ficar no lugar onde estavam. Não houve pânico, mas um espírito de festa popular! Se alguém estivesse sozinho ou apenais em dois, a dificuldade da situação não teria sido levada na brincadeira. Os corajosos e experientes tiveram oportunidade de brilhar. Os medrosos puderam valer-se da intrepidez dos mais afoitos e ninguém pensou alto na possibilidade de um bivaque improvisado na ...

To Dr. Michael Fordham (1)

Londres, 18 de junho de 1954.   Dear Fordham, Sua carta traz más notícias; senti muito que não tenha conseguido o posto no Instituto de Psiquiatria (2), ainda que seja um pequeno consolo para o senhor que tenham escolhido ao menos um de seus discípulos, o Dr. Hobson (3). Depois de tudo, o senhor se aproxima da idade em que a gente deve familiarizar-se com a dolorosa experiência de ser superado. O tempo passa e inexoravelmente somos deixados para trás, às vezes mais e às vezes menos; e temos de reconhecer que há coisas além de nosso alcance que não deveríamos lamentar, pois esta lamentação é um remanescente de uma ambição por demais jovem. Nossa libido continuará certamente querendo agarrar as estrelas, se o destino não tornasse claro, além de qualquer dúvida razoável, que devemos procurar a perfeição dentro e não fora... infelizmente! Sabemos que há muito a melhorar no interior da pessoa, de modo que devemos agradecer à adversidade quando ela nos ajuda a reunir a energia ...