Abadia Ettal, Oberbayern/Alemanha, 26 de junho 1955.
Prezado
Pater Lucas,
Muito
obrigado por sua resposta detalhada à minha carta e pelo relato de sua história
de sofrimentos e alegrias. Pode-se dizer que a experiência da graça tem um
preço elevado. Numa vida humana comum, os opostos nao se acham normalmente tão fendidos
quanto no seu caso. Os sofrimentos e as alegrias são menores e, por isso, menos
contrastantes. A luz e a sombra estão em relação complementar (Lao-Tse), assim
também alegria e sofrimento.
A questão da
privation boni não é tão simples, pois se mal é igual a não-ser, então não
existe realmente nada. Mas se eu matar alguém, então existe algo, isto é, um cadaver;
ou se eu roubar de alguém 100 marcos, então eu os tenho e não ele. Pateticamente,
o mal é tão real quanto o bem, pois ambos são fatos que uma pessoa chama de bem
e a outra, de mal. Mal = não-ser significa que eu não fiz nada de mal, pois literalmente
não fiz nada e nada está aqui, nenhum cadáver e nenhum dinheiro roubado. Bem e
mal são julgamentos humanos relativos sobre o existe, mas sobre nenhum ser em si.
Também não se pode dizer o sofrimento seja uma privação de alegria, pois isto
significa, no máximo, tédio, o que nem de longe representa sofrimento positivo.
Não deixe
que isto lhe traga mais cabelos brancos, pois já tem dificuldades que chega. O senhor
é como herói grego Gilgamesch, um “homem pesaroso-alegre”: as duas coisas lhe
cabem bem, felicidade e infelicidade, uma quarta parte de alegria e três
quartas partes de sofrimento; mas sua alegria é tal que compensa plenamente o excesso
de sofrimento. Também parece que é nisto que o senhor encontrou a sua
verdadeira vocação.
Saudações
cordiais e os melhores votos, C. G. Jung.
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