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Mensagens

A mostrar mensagens de abril, 2021

Ao Dr. Zwi Werblowsky (1)

    Amsterdã, 28 de março de 1951.   Prezado senhor Werblowsky, Espero que tenha recebido, neste ínterim, o meu curto prefácio (2). Infelizmente, só agora tenho tempo para algumas observações sobre o seu trabalho: P. 80. Proporia uma terminologia um pouco diferente. Em vez de dizer “promovendo o processo de individuação” – exatamente a coisa que não se pode fazer, porque leva imediatamente a uma inflação ou a uma identificação com arquétipos – recomendaria algo como “tornando-se temerariamente muito egoísta”. O termo individuação deve ser reservado para a evolução legítima da enteléquia individual. É bem esclarecedora sua afirmação de que a hybris foi o pior vício específico dos gregos. Corresponde ao conceito de superbia de Agostinho. Ele diz que há dois pecados capitais: a superbia e a concupiscentia (3). É de se supor então que, se o vício específico dos gregos é a superbia, o vício da concupiscentia calha para os judeus. Isto encontramos claramente em Freud, sobret

Ao Dr. Med. Bernard Aschner (1)

  Nova Iorque, 28 de março de 1951.   Prezado colega, Lembro-me muito bem de quando nos conhecemos em Viena. Foi lá que assimilei, à minha própria maneira, o seu interesse por Paracelso. Ocupei-me dele com particular interesse durante a guerra e sobretudo com sua religio medica , como ele a expôs em seu tratado De Vita Longa . Quanto à sua pergunta (2), posso dizer-lhe apenas que permaneço firme na minha posição de outrora. Esta questão evoluirá, mais cedo ou mais tarde, para uma questão humana de primeira categoria, pois rapidamente nos aproximamos de um tempo em que a alimentação das massas populacionais chegará a um limite intransponível. A Índia está em situação tal que basta uma safra ruim para desencadear a fome; e hoje em dia, graças à higiene, o mundo todo se multiplica de modo imperturbável. Isto não pode continuar por muito tempo; surgirá o problema que já está na ordem do dia de todas as sociedades primitivas, isto é, a limitação da natalidade por falta de gêneros al

Ao Pastor Werner Niederer

  Zurique, 26 de março de 1951.   Prezado Pastor! Nesses dias, ao fazer ordem em minhas coisas, encontrei o seu gentil presente de fevereiro de 1949 (1). Estou em dúvida se já lhe manifestei minha gratidão ou não. Tenho uma secretária que deve prevenir-me das consequências de minha distração e esquecimento, mas também ela às vezes se afoga na enxurrada de papéis que me invade sem parar. Seja como for, reitero o meu agradecimento e peço-lhe tolerância e o perdão dos pecados. Ao final de sua exposição, o senhor pergunta pelo mérito de Cristo, que o senhor já não entende como acontecimento mágico, mas o substitui, por assim dizer, pela integração de projeções. Isto é racionalmente correto , mas, ao que me parece, não é uma resposta bem adequada. O “mérito” psicológico (melhor: significado) de Cristo consiste em ser ele, como “primogênito”, o protótipo do teleioz, do ser humano integral. Conforme testemunho da história, esta imagem é numinosa e, por isso, só pode ser respondida

Ao Prof. Adolf Keller

  Los Angeles (Calif.) EUA, 26 de março de 1951.   Prezado amigo,   No final desta semana irei a Bollingen para passar lá o mês de abril, pois tenho muito trabalho a fazer. Esta semana estarei disponível, se quiser aparecer aqui. Agradeço muito as duas cartas que me enviou. Há muitas questões e possíveis mal-entendidos que só podem ser esclarecidos numa conversar pessoal. Caso contrário, deveria escrever tratados inteiros. Quero observar apenas que não me tornei “mais cristão”, mas que somente agora me sinto um pouco mais em condições de contribuir com algo para a psicologia do cristianismo. Sonhos podem significar muitas coisas, mas só temos uma premissa teórica para sua explicação. O princípio científico “Principia explicandi non sunt multiplicanda praeter necessitatem” (1) deve ser levado a sério. Por isso devemos ir tão longe quanto possível com a teoria da compensação (2). O tipo da quaternidade é um fato empírico, não uma doutrina . Como tantos outros sistemas, o cri

Ao Pastor Fritz Pfäfflin

  Zwiefalten (Württ) Alemanha, 22 de março de 1951.   Prezado pastor, Muito me alegrei por ter novamente notícias suas. Infelizmente não posso atender ao seu desejo (1). Tenho tanta outra coisa a fazer e já não consigo produzir o mesmo que antigamente. Também não devo trabalhar demais. Não sei qual o material de sonhos que o senhor está imaginando, nem como ele poderia estar vinculado com a neutralidade desarmada da Alemanha. O desarmamento da Alemanha já é um sonho que só pode ocorrer numa nação adormecida, e isto num povo que por duas vezes em meio século devastou os países vizinhos com a guerra! Este é o sonho de uma nação profundamente guerreira, mas que se considera conscientemente como inofensiva e amante da paz. De fato, alguém já deve estar sonhando se pensa que pode viver desarmado num mundo anárquico onde só imperam astúcia e violência. Todo alemão que não dorme e sonha sabe que está mais do que na hora de armar-se; e quanto mais conscientemente o fizer, melhor será p

Ao Dr. Med. Adolf L. Vischer

    Basileia, 21 de março de 1951.   Prezado colega! Somente agora consigo agradecer sua amável carta de 26.12.1950. Foi para mim um grande conforto receber os seus pêsames pela morte de meu último amigo mais chegado, Albert Oeri (1). É possível sentir muito esta perda, sem se tornar culpado de sentimentalismo indevido. Nessas ocasiões percebemos como a idade nos vai conduzindo para fora do tempo e do mundo, para espaços desconhecidos, onde a gente se sente algo isolado e estranho. Em seu livro (2), o senhor tratou com tanta simpatia e compreensão as peculiaridades da velhice, que certamente terá um coração compreensivo também para estado de espírito. A iminência da morte e a visão do mundo in conspectu mortis (antes da morte) são de fato experiências singulares: a sensação do presente se alarga para além do dia de hoje, revendo séculos passados e tentando adivinhar um futuro ainda por nascer. Com os sinceros agradecimentos de C. G. Jung   (1) Cf. Carta a Oeri, de 11.1

Ao Prof. Adolf Keller (1)

  Los Angeles, 20 de março de 1951.   Prezado amigo, Agradeço a sua resposta detalhada. Ela me deu uma visão clara em muitos aspectos (2). “Demonia” é literalmente uma palavra inofensiva, mas não psicologicamente. Será que chamaríamos de “demoníaco” alguém que cultiva aplicada e cuidadosamente o seu campo? Isto cheira suspeitamente a Idade Média, onde eu teria terminado numa masmorra ou numa fogueira. Por isso, a teologia e a Igreja não me são muito confiáveis, pois agem sempre “por ordem superior”, contra a qual não há apelação. O que você considera uma oposição complexada contra o protestantismo é, de minha parte, uma crítica forte contra ele, pois está onde eu queria que não estivesse. Agora, depois que a Igreja Católica deu o passo de graves consequências da Assunção, o protestantismo está verdadeiramente preso à linha patriarcal do Antigo Testamento e na retaguarda, no que se refere ao desenvolvimento dogmático. O católico ao menos acredita numa revelação progressiva,